Quartinho do medo

Por: Bia Latini

Quartinho do medo

Desci as escadas rumo ao porão
Abri a porta do quartinho do medo
Estava decidida a esvaziá-lo por completo
Assim o fiz
Senti-me forte, potente
Segui a vida bem confidente

Esqueci do quarto…

Outro dia, senti meu peito apertar sem motivo algum aparente
Desci as escadas novamente
Fui checar o aposento
Pro meu tormento,
O quarto não estava limpo
Nem esvaziado
Alguns móveis pesados pareciam brotados

De onde saiu isso?
O quarto não estava trancado? Faxinado?

Caí, exausta no chão
Bugada de tanta incompreensão

Ao acordar, um lampejo de clareza:
A partir de agora jamais deixaria a porta trancada

Ficará sempre aberta

#encarar

Por Bia Latini


Créditos da imagem: Pexels

MULHER

Por: Bia Latini

Mulher

Ser Mulher é ser beleza em seu nascedouro

Em tempos atuais, ficamos maravilhados com invenções ultrassônicas, tecnológicas, futuristas, quase roteiro de ficção científica
Mas quer achar invenção mais incrível do que um Ser com a potencialidade de gerar Gente?! Com um útero aqueduto para outro Ser Humano?!
Você pode não querer ser mãe e nunca gerar um filho, mas você é preparada para isso
A Natureza, milimetricamente, perfeitamente, sabiamente, proveu-te com esse poder

Ser Mulher é carregar, desde cedo, muitas cobranças, melindres, pudores…
Somos quase convocadas e escaladas para a Nobre Seleção das Santas, Puras, Perfeitas, Recatadas, Comportadas, Embonecadas, Minuciosamente Talhadas

Ser Mulher é muitas vezes querer andar na contramão da feminilidade para alcançar postos, lugares, espaços, ganhar vozes, fazer valer direitos, conquistar significantes respeitos
E depois bater no peito por aportar nossas desbravadoras caravelas nos destinatários cais

Ser Mulher é ser polivalente, trifásica, furtacor
É também ser sugada por isso!
Desde sempre escutamos que nós, mulheres, damos conta de tudo e que os homens são desajeitados, monofocais, unidirecionais; que não tem espectro multivertente
Sim!! Somos multiverso e constelação inteira!
Mas que possamos apenas SER!
Sem pressão, sem ditadura, sem obrigação

Ser Mulher é ter ciclo e incomodar-se, erroneamente, com ele desde menina
Em algumas culturas, sangrar é estar temporariamente impura
Ahhh….se soubéssemos ver beleza nas marcações da Natureza…
Pararíamos de querer esconder e nos livrar de nossas grandes riquezas…
Veneramos as estações: outono, inverno , primavera, verão
Mas somos incapazes de acolher nossas fases…
Ao invés de apreciarmos, observarmos e respeitarmos, ardemos em CULPAS…

Que possamos ser camaleoas, bruxas, alquimistas
Queimar nossas fogueiras
Transmutar nossos medos
Escrever nossos próprios enredos
Que possamos descobrir a Liberdade, em meio ao cerceamento físico, mental, emocional
Que consigamos nos nutrir e nos inspirar com a nossa própria criação e saibamos celebrar a natureza, tão mágica, que existe em nós
Que consigamos dar as mãos, umas às outras
E saibamos reverenciarmo-nos, admirarmo-nos e fazer auto-flerte
Que, juntas, sejamos elos de uma mesma corrente:
A Corrente do Amor, do Autorrespeito, do Autocuidado, dos Talentos Diversos, que, unidos, complementam-se

Que possamos SER, FLUIR, NOS PERMITIR, ULTRAPASSAR, EVOLUIR… com todo arcabouço de desafios, intempéries, martírios…
Acima de tudo, EXISTIR na essência MULHER

Somos potência, mesmo no Deserto!
Não longe, mas todas bem perto.

Por Bia Latini

Em 08/03/21


Créditos da imagem: Pexels

O ACABAR DA EUFORIA

Por: Diogo Verri Garcia

O ACABAR DA EUFORIA

Escrevo a ti, é quarta-feira.
Não a de cinzas, mas a seguinte e regular, dia morno e de labor.
Hoje há falta de chuva, de cansaço e de moleza,
Em perceber que se abandonou a alegoria,
Que cedeu lugar à tristeza.
O carnaval, enfim, terminou.

Sobra o acaba da euforia
Que teria lugar por mais dias.
Lamenta o que jaz até quem, tal qual a mim, descansa.
Em meio ao repinique que rastilha,
Eram lampejos de alegria.
E folião se empolgava quase feito criança.

Caminhantes por caminhos e ladeiras,
Vestidos de heróis e faladeiras
Com bolhas nos pés a sustentar.
Entre porteñas que já não cantavam tango,
Alemães já quase mancos,
com as pernas tortas, a cansar.
Juntando esforços, corrente humana e virtuosa,
Sempre vagante, fervorosa por samba, itinerantes entre os blocos.
Começando os dias passados,
terminando com eles já tortos.
Vestindo camisas vistosas, exuberantes colares,
Cultivando sorrisos expostos,
Feito estandartes aos ares.

Mas o que há no carnaval
se os dias são poucos,
Se o trânsito no Rio é louco
Se a cidade toda para?

É incerto; sei que o mundo foge do igual.
Mesmo para quem não se importe,
Ainda quando há chuva, quer nos refresque ou incomode.
Nada é comum,
Não há paz ou euforia que baste,
Quando jaz carnaval.

(Diogo Verri Garcia, 05/03/2019)


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Por: Mauricio Luz

Será que sou poeta?
Não sei dizer ou afirmar
As palavras me vem em torrentes
Desencontradas, cruas, indomáveis
E sou incapaz de dar-lhe formas, versos e rimas
Sinto que sou mais uma deslumbrada Testemunha do universo
Abobalhado com tanta beleza,
Tanto mistério em mim e fora de mim,
Que busco apenas alinhar em linhas desencontradas
Aquilo que a razão é incapaz de alcançar.
Será que sou poeta?
Não sei definir
Os sentimentos e sensações vem e vão,
Como as ondas que brincam com o navio,
Que iludido acha que controla o momento,
E está a salvo no rumo de seu destino.
Sinto que sou mais como o lápis esguio,
Que ao dançar seus versos na folha de papel,
Acelera o seu destino.
Será que sou poeta?
Não sei explicar
Só sei… e sinto…
Há mais poesia no sorriso de uma criança
Que em todos os versos já escritos e declamados,
Há mais rimas e versos no voo do beija-flor,
Que no coração dos poetas mais consagrados.
Entre o esforço da chegada e a incógnita da partida,
Há milagres tão grandiosos e tão pequenos,
Que se tornam invisíveis para quem enxerga apenas o óbvio
Uma noite eu olhei as estrelas, e elas olharam para mim,
E depois daquele encontro com o infinito
Nunca mais me encontrei com minha própria finitude
Será que sou poeta? Cientista? Espiritualista?
Ou apenas busco descobrir uma forma, uma maneira,
De descrever o que não pode ser descrito?
A ilusão daquele que deseja, com um balde furado,
Esvaziar o mar?

Mauricio Luz


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VAI, RAPAZ!

Por: Diogo Verri Garcia

VAI, RAPAZ!

Te disseram que o tempo é morada,
Caminho para todos que sofrem.
Te falaram que a vontade ficou endividada.
E com dúvida, se se entrega ou se corre.

Veja que ela também quer os teus olhos,
Mas teme do mundo a reprovação.
Nota que face à tua galhardia,
Ela também se arrepia, tem taquicardia, muda a respiração.

O que adianta se só vês essa tal menina,
Se é outra que – mesmo tu não querendo – tanto te quer que te beija?
Vai, rapaz! Rompe logo essa sina,
Ou te dedica de vez a quem também te deseja.

Quem te fala é quem tem vivência,
Porque coerência não é o dom da tua idade.
Vai, rapaz! Roube logo dela um beijo,
Que ela larga o mundo e passa a ser tua!
E esqueça o resto, pois nada mais te importa,
Desde que passastes por ela, ao acaso, na rua.

Ou então te cala e cultives a moça
Que te vê com vontade e quer te ter por rapaz.
E espere que os olhos mais belos te esqueçam,
E que vocês dois não se encontrem jamais.

Vai, rapaz! Saudade perdura!
Mesmo que sejas forte, isso machuca e adoece.
Vai rapaz, liga logo para ela.
Se não o fizeres, se arrependa, e não haverá santo, nem prece…

Dedico a ti um conselho: confie no instinto,
Mesmo que seja confusa e irracional a razão.
Pegue pra ti! Toma logo essa moça
Que te embaralha os pés, te aquece o corpo e te dá emoção.

Vai, rapaz! Amor só se tem um na vida,
E o tempo para outros é abismo e cilada.
Sou eu teu espelho, e cá venho te avisar:
Fica com ela, serás feliz, e mais nada.

(Diogo Verri Garcia, Rio, 25/07/2018)


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Amizade

Por: Bianca Latini

Amizade

Amizade é rio

Correnteza de prosperidade

Jornadas que confluem

Influem

Fundem-se, somam-se

Às vezes separam-se

Mas a nascente do rio permanece em sua matriz jorrante

De água, de amor, de bem-querer, de acolhimento, paz, risada, entendimento, divergência, frutificação de nova percepção, através do olhar do outro

Amizade é abraço, laço, ponte, tijolo, contrução de afetos

Entrega e Recepção

Percepção

Amizade é expor-se em sua nudez, perder a dita sensatez do que  o outro espera que sejamos

Grandes amizades só surgem da permissão à vulnerabilidade, da exposição do nosso eu mais menino, mais desprotegido e também mais louco e feliz, sedento por novas experiências

É na exposição das nossas feridas, dos nossos medos, desejos e piradas, que as amizades ganham raízes nutritivas, que são como que passaporte para uma rede de proteção, onde nos sentimos seguros e amparados pelo acolhimento e o espaço que o outro nos dá para sermos nós mesmos

Tem amigo que chega no início das nossas vidas, pela amizade dos nossos pais, amigo do colégio, do prédio, da faculdade, amigo dos nossos amigos, amigo do trabalho, de um esbarrão na rua, pela “obra do acaso”, amigos que tinham tudo para ser desafeto….mas…o feto da amizade é feto fértil, potente, latente, ainda que fisicamente distantes os amigos. E basta um sorriso, um olhar, uma palavra, ou mesmo um silêncio….para que, num instante, nossa vida se transforme num imenso abraço!

E viva a amizade-laço!

Por Bia Latini

Por: Mauricio Luz

Um movimento, uma ondulação
E uma doce fenda revela
Um pouco de você.
Revela sem revelar
Instiga o devaneio, a fantasia
Como a água do mar faz
Com a sede do náufrago que
Perdido no oceano
Sonha em chegar na praia.
Ah, fenda! Não está só no vestido!
Está na minha vontade, na minha arrogância
Mostrou o rasgo no meu tecido de aparências,
A divisão entre o meu querer e o meu dever
Placas tectônicas que provocam
Mil terremotos em mim.
O que fazer? Para onde olhar?
Como desviar-me das curvas que
Me jogam contra meu controle,
As minhas regras?
O que fazer quando a visão da sereia
Me alcança desamarrado do mastro?
Mais um movimento, mais uma ondulação,
A traidora fenda revela
um pouco mais de você
E de mim.
Justamente, vejo-me perdido,
Quando posso ter me encontrado.

Mauricio Luz


Créditos da imagem: Pixabay

A viagem

Por: Mauricio Luz

A viagem

Dizem que a vida passa
Quando menos se espera,
Ela se vai
Mas somos nós que passamos,
Navios vagando no oceano da existência
Na ilusão de que são portos seguros
Até sempre lembrados de sua condição,
Pelas surpresas do imponderável.
Navegando e vagando
Entre as vagas que se erguem
No mar de mistérios que nos cerca
Outros navios encontramos.
Tamanhos diferentes, cores distintas,
Diversos, únicos e incontáveis
Como os átomos que formam o vento
Que nos dão alento.
A rota traçada pelo mais exímio capitão,
Não controla as tempestades do navegar.
Tampouco as bonanças e as boaventuras,
E os demais navios com os quais certamente cruzará.
Mas das poucas coisas que o navegante experiente
Sabe e sente
Os outros navios com os quais se encontra
Trazem mercadorias e especiarias
Que alimentam o corpo e a alma:
O tempo concedido, O sincero respeito,
O amor perfumado e sincero.
E a certeza inconsciente de que são muitos barcos, muitos desvios
Mas o destino é o mesmo
E o impreciso navegar fica mais leve
Quando pão e o vinho das experiências da viagem,
São divididas na mesa da refeição da Amizade.
Multiplicam-se infinitamente,
Concedendo energia e graça ao corpo e à alma,
A certeza de que se a chegada é a mesma,
Não importa o destino,
O importante é a viagem.

Mauricio Luz


Créditos da imagem: Pixabay

Por: Mauricio Luz

Às vezes, me é tão difícil
Estabelecer fronteiras, reconhecer divisas
Onde começam e acabam as coisas!
Pois não seria o infinito
Formado de pequenos finitos?
E o que chamamos de morte não integra
O misterioso processo da vida?
O que é o Todo senão o Nada?
Aquilo que se chama de matéria
Não é apenas o vazio condensado?
O que é o tempo senão o espaço
Que separa dois agoras?
Não seria a eternidade
A soma de todos os momentos?
E se o fim de algo gera um novo começo
Há realmente fim?
É tão difícil estabelecer fronteiras!
Será que elas mesmo existem?
Ou são as grades da cadeia de ilusões
Que eu mesmo forjei
E nela me aprisionei?

Mauricio Luz


Créditos da imagem: Pixabay

Não esqueçamos o Natal do Ser

Por: Bia Latini

Não esqueçamos o Natal do Ser

O quanto vivemos fingindo
Sobre aquilo que nem sabemos que gostamos?
Sobre aquilo que não nos oportunizamos?
Natal vem chegando e queremos comprar presentes
Tem presente mais caro do que clareza, percepção?!
Podemos enfeitar a árvore
Mas joguemos luz sobre nós mesmos
Sobre nossos seres famintos, sedentos, carentes e disfuncionais

Façamos limpeza em nossas casas para morada das ceias
Mas não nos esqueçamos de fazer faxina em nossas ruas internas, abrindo espaço para o que precisa desentupir, desengargalar

Prestemos atenção aos nossos rompantes:
eles falam muito sobre quem estamos deixando de ser
Sobre aquilo que abandonamos fazer
Sobre a fluidez, da qual poderíamos nos prover
Sobre todo presente que deixamos de receber
Pois estarmos aqui:
Rotacionando no rodamoinho da matriz
Aspiralando para o ralo do “todo mundo” e depois não sabemos de onde vem tanta insatisfação
As nascentes dos nossos rios não jorram mais água
Elas dragam Rivotril

Que possamos montar o falso pinheiro
Fazendo alusão ao Eu verdadeiro
Ir colocando as partes, arrumando a base, os galhos…e a cereja do bolo… ou melhor, da arrumação…
É ela: a Estrela, no cume
Aqui em nossa analogia, vulgo: coração

Cantemos as canções Natalinas
Sem deixar, cristalinas, as músicas que pulsam em nós.

Viva o Natal do Ser!

Por Bia Latini


Créditos da imagem: Unsplash