O poro ainda pora

Por: Bia Latini

O poro ainda pora

O poro ainda sente
O poro ainda ressente
O poro ainda se defende dos perigos de outrora
O poro ainda pora
O poro ainda demora em tanta escassez
O poro tem medo de todos vocês
O poro chora
O poro está, mas não vive o agora
O poro não segue
Ele vai
Mas sempre fica
Na memória
No gatilho
O poro ainda pora na carência
Na latência da dormência da falta doída
A ferida fechada, mas ainda aberta
Ainda viva
Ainda reprimida pela máscara
Pela cortina
Pelo manto do verniz que acoberta
ator, atriz
Dilacerados
Usurpados de si mesmos
Hóspedes da própria casa
Joguetes nas mãos do acaso
Reféns dos próprios dramas
Que comece a marcha para os labirintos humanos…

Quem vai cavar a própria cova?

Por Bia Latini


Créditos da imagem: Freepik

Os Quatro Elementos – Terra

Por: Mauricio Luz

Os Quatro Elementos – Terra

O perfume que exalas
Após a chuva que te encharcas
É uma irresistível sedução para meus sentidos
Exaustos de plástico e artificialidade
Ah, Terra, Terra…
Descalço, eu te sinto
Que meu pisar não deixe cicatrizes
Mas as marcas do amante que se entrega à amada
Recebe meus passos como beijos!
Ah, Terra…
Que me apoia sem condições,
Que me alimenta sem restrições,
Que me suporta incansavelmente!
Concedeu-me partes de si mesma
Para que eu me formasse
E em teu colo amoroso,
Pudesse contemplar as estrelas!
Teu toque me energiza, tuas cores me enlaçam,
E a vida que gera impulsiona a minha.
Ah, Terra, obrigado!
Sei que não tenho te amado como poderia
Mas nossos laços são indestrutíveis.
O que te faço me afeta mais a mim do que a ti,
Pois meu corpo é teu, tua dádiva, teu presente!
E quando voltarmos a ser um só,
Receba-me em teu leito para que possa renascer
Nas flores e frutos que brotam de ti

Mauricio Luz


Créditos da imagem: Pixabay

Chispa Divina

Por: Mauricio Luz

Chispa Divina

Gatinho, na varanda
Seus felinos olhos azuis
Contemplam a chuva que cai
Será que buscam entender
De onde vem? Para onde vai?
Por que tudo isto?

Eu, na varanda
Meus humanos olhos castanhos
Contemplam o pequeno felino
E me vejo encarando um espelho
Será que quando contemplo as estrelas
Tenho a mesma expressão?
E que o sorriso que dou ao observar
a curiosidade felina
É o mesmo sorriso que provoco
Quando observado por olhos atemporais?

Mauricio Luz


Créditos da imagem: Pixabay

A vida simplesmente é…

Por: Bia Latini

A vida simplesmente é…

A vida é simplesmente assim
Ela é
Ela simplesmente é
Ela flui, às vezes para, entope, desenrola, recomeça, pausa, se mostra, revela
Ela engargala e parece que não tem brisa
Depois vem tufão
Tudo brota, morre, se reconta
Desmonta
Ergue
Frui, flui, embui
A vida singelamente é
Com a magnitude da simplicidade dos capítulos, dos ciclos, dos momentos
Basta a permissão do piscar dos cílios
Essas cortinas da nossa janela visual
Temos pele, farejador, orelhão
E o Rei de Copas
A vida mora em nós
Ela habita antes de nascermos
E não desintegra quando o transeunte vai embora
A vida é
Ela simplesmente é…..

Por Bia Latini


Créditos da imagem: Desconhecido

Contemplação ao corriqueiro

Por: Priscila Menino

Contemplação ao corriqueiro

Vez ou outra me pego pensando na falta que faz contemplar o corriqueiro.
Ali estava eu, você, nós, dia normal, nada atípico.
Correria, telefonemas, trabalho, refeições, mais um dia chegando ao fim.
E o sol vai indo embora e eu paro e penso na beleza de viver mais um dia normal, com minhas pessoas normais (ou anormais).
Nada espetacular, só um momento no qual parei, olhei e agradeci por viver o extraordinariamente normal.
Entre tanta agitação, tantas obrigações, tanta falta de tempo, eis eu aqui, contemplando a beleza de viver, a beleza da vida, de sentir a felicidade de viver o corriqueiro.
Criamos planos demais, projetos demais e não olhamos o aqui agora.
Injustos com a vida que nos agracia todo dia com um novo por do sol, com mais uma noite de sono deitados em nossos infinitos.
Quero é mais observar a beleza de esvair o olhar em meio ao crepúsculo e sentir a felicidade de somente sentir o meu agora.
Que vire rotina: contemplar o corriqueiro.

Por: Priscila Menino


Créditos da imagem: Freepik

Ei, narrador!

Por: Bia Latini

Ei, narrador!

Ei, narrador!
Que personagem você vestiu?
Quem foi que você pariu?
Cê tá contando o enredo da pele pra fora
Mas cê sabe a verdadeira história da pele pra dentro?
Já ouviu o que contam suas vísceras, seu estômago, seu processo digestivo e até mesmo seu embrião? Aquela semente que nem vestia pagão?
Fazer caminho pra fora, você já está expert!
O que falta é caminhar pra dentro
É a mesma lógica
Só mudar a direção
Sai da periferia, da balbúrdia, da distração
Vai pro núcleo, o cerne, o âmago, o coração
Descobre que veias pulsam lá
O que precisa bombear
O que embala suas histórias mais profundas
O que inunda
Que crateras ainda há a sarar
Sai de onde você está
Vai pro lado de lá
Enfim, suas respostas, seu sagrado, o tão procurado vai achar.

Por Bia Latini


Créditos da imagem: Pexels

Ei, corredor!

Por: Bia Latini

Ei, corredor!

Você fura, mas não penetra
Vê, mas não enxerga
Sobrevoa, mas não pousa
Dá rasante
Mero passante
Não se faz hospedeiro
Não deixa ficar
Não martela, até encaixar
Você não dá tempo ao tempo
Não deixa reverberar
Quer logo cuspir, expelir, liberar
Pra passar rápido
Pra ir pra página seguinte , o capítulo posterior
Sempre a próxima viagem…

Eiii, corredor! Fica aqui um pouco!
Entende este momento
Desfruta, saboreia e, nele, clareia!
Deixe-se alimentar, nutrir, descascar: folha por folha, pele por pele, camada por camada
Cada estação dura 90 dias
E você quer plantar, semear, frutificar, colher, comer e replantar em uma semana!

Deixa o tempo te penetrar
Se ele pudesse te espelhar, e pode, tu irias te assustar!
Com a tua pressa, tua urgência, tua demência em não saber que apressado come cru
Até entendo tua sede de vida!
É digna, é bem-vinda, é salutar
Mas deixa o ímpeto descansar…
Um pouco, o suficiente pra maturar
Esquece lá na frente, desapega da correria
Faz viver cada dia
E consciência despertar
Entende que a eternidade é o tempo certo
E a evolução ninguém há de te roubar,
se a ela quiseres te filiar.

Por Bia Latini


Créditos da imagem: Pexels

Porto em peito aberto

Por: Bia Latini

Porto em peito aberto

Voe e pouse em alguém apto
a se encher e a se esvaziar
a receber e a transbordar
Sem medo de amar, de receber amor, de sentir dor, de se inebriar com a flor, de perceber o quanto percebemos, o quanto sentimos, o quanto parimos …
sensações, momentos, sentimentos
Alguém livre pra ser catavento
Sair do convento
Abrir todo aposento
Fortificar o fermento
Arruinar o tormento
Catalisar o incremento
Subir no jumento
E galopar gargalhando
Movimentando a própria crina
Amansando a própria juba
Comendo jujuba e oferecendo pro outro as cores sortidas de açúcar e divertimento .

Por Bia Latini


Créditos da imagem: Pinterest

Na imensidão deste salão

Por: Bia Latini

Na imensidão deste salão
(mais uma experiência, vivência, entrega às waves do @5ritmos_riodejaneiro)

Eu estou hipérbole tentando caber em onomatopeia
Pororoca só conseguindo manifestar riacho
É tanto borbulho dentro
E um canal estreito rumo a fora, que nada dá vazão
Ao menos, quando me disponho a calar a mente, silenciar as palavras e deixar o borbulho sintonizar o ritmo…
Quando permito que meu corpo me guie, me mostre, através do som, da permissão ao frisson, ao tesão, à raiva, à alegria, à fluidez, às peripécias, mirabolancias, ao êxtase, ao caos, à quietude, ao que, aparentemente não faz sentido nenhum…Meu corpo abre as portas da cela pra mim.
Mexem-se partes que eu nem supunha existir.
Neste momento, ali no salão, num espaço de não julgamento, onde todos dispuseram-se a uma reza corporal, onde todos se veem de olhos fechados e sintonizam-se pela entrega, o mundo está ali; as possibilidades estão ali; naquele metro quadrado, que parece um latifúndio de alternativas, desamarras, libertação e exultação ao escoamento.
É templo. Eu me enxergo em potência, vida. Eu me deixo manifestar. Ali o canal não é nada estreito. É canal que liberta e escancara o peito. E não é sobre tamanho. É sobre permissão.
Ali, naquele espaço, ao final das ondas dos 5 ritmos, brota em mim a constatação:
É impossível guardar tudo isso. É necessário e feliz escoar.
O choro aparece, em expurgo e gosto de Eu sou o eu sou.

Por Bia Latini


Créditos da imagem: Unsplash

Por que não acontecer em varais?

Por: Bia Latini

Por que não acontecer em varais?

Morte
Vida
Ferida
O abismo entre as extremidades do corte
A fornicadora expectativa
O temor da partida
Seja partida de início ou de fim
Há tanta atenção para os polos
Os entremeios ficam pro final da fila
Se é que entram nela
São onde se altera, acontece, mexe, cria, conduz….
E enfim reluz
Entendimento, discernimento, acontecimento, integração do que se pensava ser com o que, de de fato, é

O proibido, o sagrado, o pecado, o compromisso, o juízo, o julgamento…
Deixam o ator na moldura da janela
Assistindo às paisagens que passam rápido
E muitas vezes nem lhe dizem respeito
Mas é como se, uma vez na janela, impelido se está a agonizar na dúvida da decisão, na bifurcação entre o bem e o mal; o certo e o errado; o justo e o injusto
Que diabos de vida é está onde tem-se o quadrado certo pra tudo
e todas a hipóteses precisam de desfecho?
Por que simplesmente não poderíamos acontecer em varais?

Por Bia Latini


Créditos da imagem: Freepik