Quando o vento se torna em aragem
Por: Diogo Verri Garcia
No marco zero, tudo é calmo e quieto
Que de tão silencioso é deveras isento.
É quando começa a aragem.
Que movimenta o silêncio
De rumor rigoroso, experto.
De acanhamento que chega a ser lento,
Mas que já muda algo em paisagem.
Ouve-se um zumbido que apita ao ouvido
Pois não há nada mais para se ouvir,
nem para ver.
Antes da aragem, que é ainda menos que a brisa,
Até onde as ondas do mar se alisam.
Nem uma folha:
não há o que se permita mover.
Tudo começa tão calmo,
Mas logo chega a aragem.
A disposição do mar é de um nada,
A calmaria impera.
Sequer há o que indique a direção do vento,
Que mal acaricia as velas.
Há morosidade, quase uma lerdeza,
O pundonor das coisas é um regalo a recolhimento.
O vento, sem disposição para nada, ele não se moverá.
Mas já move o véu da chama, que nem para isso inflama;
não balança a flâmula, que reclamarará.
O brio do silêncio é castiço
Não se mexem nem as folhas, nem os panos,
Posto que nada sequer nessa paisagem
tem a pretensão de mudar.
É espelhado e parado, sem reclamos, o mar…
Quando então o vento se torna algo mais que aragem.
Ainda que, sendo pouca a mudança,
Parece tudo inerte, dentre o que mais se avista ou avisa,
Dentre as gramíneas, há uma leve brisa.
Desfraldam-se atentos os tempos dos litorais.
É aragem, que ameaça ser ventania,
E nos varais já carregam as pazes e as camisas.
Mas não ainda bastante;
não solta as folhas lá dos coqueirais.
É caminho para quem espera a ver o momento
Que descaminha as cercanias;
Sobe um aroma de chuva, cheiro de grama ou de arruda no ar.
Chacoalha os contornos das águas,
E assim balança o mar.
Há a virada do tempo.
A vida para, espreita a ver o que passa.
É o início do vento.
(Diogo Verri Garcia, Rio de Janeiro, fev. de 2019)
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