Arranhos
Por: Mona Vilardo
Quando o ano começa a se despedir, começam também os encontros de amigos e os encerramentos de cursos.
Essa semana tive o meu primeiro almoço de encerramento. Foi com as amigas do curso de História da Arte. Elas me chamam de mascote do grupo, já que a maioria delas é de jovens senhoras acima dos 70 anos. Poderia dizer que elas são duas vezes eu, e sendo assim, têm duas vezes mais recordações para contar e histórias gostosas para compartilhar num final de ano que se aproxima.
Tem aquela que fala de suas viagens pelo mundo, afirmando que viajar é o que mais nos enriquece. A outra, cerimonialista de grandes eventos, fala de suas festas até a madrugada, e da quantidade de casamentos que já passou por suas mãos. Hoje, já diminuiu o ritmo das festas, mas mantém na memória belas lembranças.
Depois da primeira taça de prosecco, a que está sempre elegante fala dos filhos já criados e de suas conquistas. É tempo de descansar.
Um gole de vinho faz a outra relembrar do marido que já se foi deixando saudade.
A que está sentada perto de mim diz que o neto chama as suas rugas de “arranhos”. Que poético, eu penso.
A mais falante do grupo descreve o pai que teve. Lembra das proibições de várias décadas passadas. Mas diz que era bem moderna para o seu tempo, fazendo faculdade à noite, numa época em que isso não era comum entre mulheres.
A outra, de fala firme, se lembra que antes de casar não podia entrar no carro do namorado sozinha, e diz que hoje é tudo muito diferente.
A mais calada arregala o olho atrás dos óculos e fala: É, o tempo voa!
– E a tecnologia avança – reclama a outra que não curte toda essa evolução. Ela diz que se alguém quiser falar com ela, que pegue o telefone e ligue.
A mais falante relembra seus tempos de monareta. Nessa hora eu não entendo nada e
pergunto o que é aquilo, reforçando meu apelido de mascote entre aquelas mulheres que ativam a minha curiosidade.
Da anfitriã, ganhamos lindos cupcakes com desenhos natalinos, afirmando que a gentileza é atemporal.
O assunto vai para vaidade, e falamos sobre marcas de batom. Logo, eu lembro do famoso batom verde da década de 80, minha mãe tinha e eu me recordo de pegar para usar.
Elas me olham e falam: – Nossa, você lembra desse batom? É da sua época?
Pois é, jovens senhoras, também começo a criar meus “arranhos”. Afinal, do que é feita a vida se não de memórias que só o tempo traz?
Um brinde aos nossos arranhos! Um brinde a essas jovens senhoras!
Maravilhoso texto !! Quanta sensibilidade …e quanta beleza para guardar na memória e no coração…por que é isso que nos faz ricos …as emoções, os momentos e agora os ” arranhos” … Amei. Beijo grande.
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Uma poesia! Um deleite”ouvir” estas histórias, estes arranhos!
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Parabéns pela belíssima narrativa poética sobre o tempo, a amizade, a vida enfim!
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