Feliz Natal!

Por: Literarte

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Caros amigos leitores,

Desejamos um Feliz Natal a todos. Que seja uma noite de paz e de luz para todas as famílias. Que o mundo seja regado de versos, e que nossos risos sejam crônicas, contadas para toda a vida.

Um abraço,

Literarte.


Créditos da imagem: arquivo pessoal DVG

Sejamos trapezistas

Por: Mona Vilardo

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Essa semana assisti um filme que não era bom. Tentei mais que a metade do filme, mas desisti. Ainda bem que já estou praticamente de férias, porque quando isso acontece quando estou cheia de coisa para fazer, a frustração é maior. Perder tempo assistindo filme ruim quando não se tem tempo a perder é o fim!

Mas, uma frase do filme ficou marcada em mim. Num certo momento o personagem principal precisa tomar uma decisão sem pensar muito, é quando o companheiro dele diz: – É quando pensa muito que o trapezista cai.

Pronto, ali estava a frase que eu precisava para escrever meu texto dessa semana.

– Obrigada, filme ruim! Tudo sempre serve para alguma coisa, até mesmo o que é ruim!

Na próxima semana é Natal. Acho que é a data que menos temos que pensar. Veja se você concorda comigo:

Se a gente pensar demais, desistimos de ir na festa de Natal que aquela tia – que você nunca vê durante o ano – organizou. Coitada das tias, elas são sempre colocadas nessa situação de promoverem “festa estranha com gente esquisita”. Quase sempre é na casa da tia que essas festas acontecem. Pois é … se pensarmos muito, desistimos de ir, e também não iremos ver aquele primo que tem tanta coisa pra lembrar da época da juventude, ou aquela avó que todo mundo pensa que vai ser o último Natal dela.

Então, não pense muito e vá na festa de Natal! Ela poderá ser a sua última também. (Momento “Cruzes, Mona, sai pra lá”). Mas o dia de amanhã ninguém sabe, certo?

Confraternize, diga que sente saudades, distribuía sorrisos e agradeça a sua tia pois só ela consegue reunir toda a família nessa data.

Outro assunto que é melhor não pensar muito é a crença religiosa de cada um. Imagina na mesma família que tem católico, evangélico, macumbeiro e espírita? Vá pelo sentimento de amor, esse sim é a crença que une todo mundo. A crença em A, B ou C, você deixa em casa na noite de Natal e nem pense em impor ela quando seu primo (aquele das histórias da juventude) pede mais uma taça de vinho. É um momento de confraternização e não de debates ou convencimentos. Ah, isso vale para política também, claro! Diria até que é uma boa data pra você fazer as pazes com aquele parente que tem o voto diferente do seu.

Por fim, me direciono à tão famosa rabanada. Minha opinião é que você não fique pensando se come ou não a segunda, a terceira, quiçá a quarta rabanada. Esse delicioso prato natalino só aparece nessa época do ano … se permita. Nem se incomode que o ano novo está aí e você precisa caber no vestido branco que comprou.  Vai lá e coma a sua rabanada.

Pensar demais numa noite de Natal não é a melhor coisa para fazer, talvez o melhor da data seja isso: pensar de menos e sentir demais! Se jogue sem pensar, assim como faz o trapezista!

Um Natal cheio de sentido e menos pensado para todos os leitores do literarte.art


Créditos da imagem: pixabay

Casa Velha

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Por: Diogo Verri Garcia

Casa Velha (prosa rimada)

A casa era velha, tão velha quanto suas emoções.
Pouco havia dentro, apenas retratos, panelas,
lembranças, devoções.
Também velha era sua moradora, que não sabia mais quando iria partir.
As tarefas diárias já se tornaram batalhas vindouras,
Que sempre especulava se iria realmente conseguir.
Aquela senhora, de jeito simples, palavras meigas,
E coração apertado – inebriado como o que me deixou.
Vestia-se elegantemente com seus trapos, pelo tempo desgastados.
As de outrora finas sedas tornaram-se farrapos,
com que espantalhos vestiriam-se a contento.
Perguntei sobre sua família, mães, tias, histórias e paixões.
Ela mostrou-me uma pilha, amontoada em uma caixa, com retrato e decepções.
Mencionou que o amor funcionou, por um determinado tempo, de forma mais feliz.
Porém, depois, Deus a provocou, o amor falhou e, conformada, só queixou:
– o destino assim quis.
Filhos? – questionei, quase como um entrevistador ávido pelo que o entrevistado escondeu.
A frágil senhora sorriu, em um sorriso triste, que calou-me a voz – amedrontada pela resposta – e tornou minh’alma um tenebroso breu.
O que houve? – insisti. Já arrependido das perguntas torpes e vorazes que fiz.
Triste em vida – relatou a infante senhora triste; infante, por acreditar ingênua, nos olhos a esperar por alguém que nunca mais apareceu.
Disse que sua família era raiz, com Beatriz e outros dois, cujo nome esqueci – pois não anotei.
Que, por longo tempo, foram em cinco, um tempo que viviam com doce afinco. Para viver outra vez, percebi que das lembranças mais profundas a sóbria senhora recorreu.
Mas continuou, ao afirmar que a vida dá voltas, como anedotas que só são engraçadas para que não as sente.
O final – como toda história – tem gente que saí e bate a porta, gente que não é mais devota, e gente – no caso, ela – que ressente.
Explicou que Beatriz casou-se, e desde o início ela desconfiou que ali não haveria felicidade.
O outro filho mudou-se, foi viver fora – longe mesmo, ponderou: em distante cidade.
O filho que sobrou viveu com ela e com o marido, por não ter outro abrigo, emprego, um canto seu.
E dali em diante, chorou aquela senhora, em pranto soluçado, preparando-se a contar o que se sucedeu.
Beatriz casou-se com José Maurício, rapaz bonito, mas propício a ter mãos dadas com a deslealdade.
Ele sempre visou seu próprio benefício, mas aguardou – pacientemente – o passar de um interstício para demonstrar quem era, na verdade.
O então rapaz convenceu a filha, que pressionou a família a penhorar seu melhor bem.
– José é rapaz sabido, minha mãe! – disse-lhe a filha, alegando que nunca haveria mal a ninguém.
José alegava ter três faculdade, o que, com sinceridade, eu, incrédulo, não acreditei.
Mas a sóbria senhora acenou, confirmou que era verdade: que a maldade se prepara, veste fina fardagem, como quem vai ao baile do rei.
E foi feita a penhora, para que Zé investisse no ofício – que, em tese, seria propício a trazer fortuna a família.
– José vai construir edifício! – com orgulho, repetia sua tola e apaixonada jovem filha.
Mas o rapaz ostentava vício, desde o início era visto nos rincões mais torpes da cidade.
O negócio não foi tratado com afinco e, no casamento, frouxo cinto amarrava-lhe a castidade.
Os pais, assustados, rezavam. E a obra ficava abandonada, quando Zé fugia para o Rio, por três vezes, sempre no carnaval.
O dinheiro que a fortuna anunciava, agora já faltava, e houve nos bens dos pais um novo empenho.
José, quase pobre, anunciou-se mudado, procurou o pastor, o caboclo, o vigário,
Retomou a frente no comando da obra, que desde então ganhou novo desempenho.
Mas o que inicia errado, segue fadado – ponderou a senhora, já em consternação.
José Maurício em nada havia se transformado. Se existiu vontade – não bastava -, não houve devoção.
Gastava o (pouco) dinheiro com damas e meretrício. Então, o armistício quebrou-se, e os credores exigiram sua parte.
Os pais pressionaram a filha, que voltou-se contra a família, acusada em sua dignidade.
O filho mais novo, compreendendo o factício, confrontou José Maurício, que uma pancada lhe deu.
O jovem precipitou-se contra um bloco do edifício, bateu a cabeça, morreu.
O pai, ao tomar causa do fato, teve suador, náuseas, mal extremo, um infarto.
No mais fino indumento, acompanhou o filho em sepultamento: e nada mais se avençou, além do tempo da dor.
Beatriz apoiou o marido, gastou o pouco dinheiro restante com advogado – não enviou sequer recado.
Não procurou a mãe, para acalentar-lhe o sofrimento, ou doar-lhe amor.
O filho do meio talvez nem saiba do ocorrido. Nunca voltou: ninguém dele sabe, desde que partiu.
Alguns dizem que por outrem se apaixonou, conseguiu boa vida e seguiu.
A triste senhora ficou só, envolta naquela casa, que tanta felicidade e tristeza lhe deu.
Deixou-me calado, com dó, e com alma pesada, por deixá-la lá – com a entrevista acabada -,
com as lembranças ousadas que este alguém lhe reviveu.
Aquela mal pintada parede – de tinta suja e desgastada pela passagem das épocas –
Refletiam a sombra dela, quando sentou-se perto da janela, tomando algum sol que a manhã traz.
Aquela mesma sombra, hoje triste e velha,
Já foi sombra de alguém feliz demais…

(Diogo Verri Garcia, Rio, 14/09/2018).

*Autoral


Crédito da imagem: pixabay.

Procurando contemporâneos

Por: Tadany Cargnin dos Santos

 

Às vezes caminho pelas ruas procurando contemporâneos

Sejam eles estrangeiros, sejam eles conterrâneos

Mas que tenham peculiares sutilidades

As quais se expressam em suas atitudes, suas vontades

E que, dentre tantas, possuam algumas destas beldades

Um olho que goste de arte

Para que a fortuna da imaginação seja encontrada em qualquer parte

Um ouvido que aprecie a música dos pássaros

Para que a sinfonia natural seja sempre um deleitável amparo

Uma mente que se deleite com um poema

Para ter a capacidade de ver o mundo arquitetado por outro esquema

Um corpo que desfrute da tranquilidade dos parques

Pois neles há outra dimensão, onde existe um encantador portal de embarque

Um coração que dispara quando o sol se põe e incendia quando a lua aparece

Pois os fenômenos naturais, à essência humana sempre enaltece

Às vezes, a sorte me apresenta tal companhia

Em inexprimíveis encontros, exuberantes algaravias

Isto já aconteceu em vários lugares

Em terras distantes, em idiomas diferentes, em distintos lares

Mas na maioria das vezes, a busca não leva à nenhuma descoberta

Então, vez que outra penso, talvez por isso se exalta esta pretensão de poeta

Para manifestar os impetuosos anseios, que a esta apaixonada alma, dá na veneta.

PS: Para citar este Poema:

Cargnin dos Santos, Tadany.Procurando contemporâneos. www.tadany.org®

Gefangen

Por: Mona Vilardo

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No dia que o prefeito foi preso, eu também fui.

Pela primeira vez na vida eu senti roubada a minha liberdade, o meu direito de ir e vir e a minha voz.

A sorte é que estava com uma amiga, e nessas horas ter amigos juntos é o que nos faz sentir mais fortes e amparados.

No ato da prisão, decidimos olhar o que tínhamos na bolsa, pois não nos deram nem o direito de buscar nada em casa. Fomos presas quando colocamos os pés para fora de casa, naquela segunda feira de manhã. Vestíamos roupas confortáveis e saímos após tomarmos uma xícara de café preto, enquanto planejávamos nosso dia.

Muito bem, voltando à bolsa. Nela tínhamos água, uma maça, um saco de balas de gengibre, um livro e alguns trocados.

Comecei a concluir que não iríamos passar sede ou fome, a bala de gengibre serviria para adoçar aquele momento e o livro nos manteria em contato com a literatura. Por fim, ter poucos trocados não seria o problema, afinal não iríamos comprar nada na prisão.

Também não sairíamos no jornal e nem provocaríamos tumulto no trânsito. E o melhor, a minha consciência estava tranquila, afinal uma hora ou outra eu iria ser solta. Nós iríamos, também confiava piamente na inocência da minha amiga.

Então, para a nossa sorte, o alvará de soltura não demorou muito. Cerca de 40 minutos depois o assistente técnico do elevador chegou. Sim, estávamos presas no 13º andar do meu prédio, e a amiga que conto, viria ser a minha hóspede alemã que tinha acabado de chegar. Que ótima recepção!

– Na Alemanha isso nunca me aconteceu. – Falava ela com aqueles olhos verdes arregalados.

– É amiga, aqui no Brasil acontecem várias prisões. Mas isso não é assunto para as suas férias.

Saímos daquela prisão e o que eu mais usei lá foi o celular para escrever esse texto. Enquanto meine Freundin2 usava o mesmo para jogar paciência – algo que devemos ter num momento como esse.

Quanto ao prefeito eu não consegui acompanhar muito bem sua história, achei bem mais interessante e literária a minha.

E por fim, concluí que em caso de prisões o melhor é ter paciência (no celular e na alma) e bom humor. Ah, dependendo da prisão, claro!

1 – Prisão

2 – Minha amiga

DOR INFANTIL

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Por Thiago Amério

 

Não se sabe ao certo…

Aquele ser indefeso

Tem o campo aberto

Para ser atacado
Sem a blindagem da experiência

Sangra direto na pele
O ataque do covarde
Por que esse sofrimento?
Será que Deus ao criar a terra

Encontrou na dor da criatura prematura

O preço para ir direto ao paraíso?
Como explicar quem

Mesmo neném

Abraça o câncer?
Que culpa tem
Pelo estupro do seu futuro?

Quando na pele o pai que protege

Torna-se o algoz do seu sorriso?

Herói do seu pranto?

Em meio a traumas,
A miniatura da vida chora.
Roga ao céu, uma ponta de esperança.

A saudade do crescimento da mudança.

 

Arboresce

Por: Diogo Verri Garcia

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Está chuviscando já,
Uma garoazinha…
O dia é vazio, cinza.
Uma brisa sem vento,
Em que a paz é sozinha

Tem dias que a vida pesa
E de apesar em apesar,
Nota que damos razão em pensar assim dela.
Tem dias que a vida reza
Para deixarmos de pesar – ávidos em reclamar –
E olhemos o tanto de tanto
Que brota à janela

Mas há quem entenda que a vida preza;
E fazem prece feliz, em descalabro ao remanso.
Apegam-se à vida, que aquiesce
– o caminho cabe a quem o estabelece.
Ao verem em si seu ardor, notam a vida;
Na espera de todo bem que há,
Tornam a dor tão leve e esvanecida.

E propositadamente jogam-se a sentir a garoa.
Percebem a gota que forma e cresce:
Toda água é um pranto que estabelece uma proa.
Feito um orvalho que rola e pelo rosto desce,
É momento feliz de paz recebida.

Tem vezes que a vida pesa
Quando vivemos pensando em pesar, por pesar.
Nos aborrece – e a vida se aborrece –
Por não viver, sem nada ver,
Sem notar
Que frequentemente …
Tem muitos dias em que a vida arboresce.

(Diogo Verri Garcia, 02/11/2018)

Sempre Presente

Por: Tadany Cargnin dos Santos

 

Sempre Presente

Sombras de pensamentos que me perseguem

Morte em vida de uma vida em direção à morte

Astros, noites e buracos

Sóis, estrelas e luzes

Perseguições iluminadas de pensamentos gloriosos

Desejo infindo de ser

Anseio profundo de ter

Ânimo intenso de ser e ter, enquanto viver

Fragmentos de impulsos cósmicos

Onde o tudo ser e o tudo ter, é

É uma sombra daquilo que o forma

O pensamento original que não persegue

Mas segue, sem direção, nem pretensão

Pois sua manifestação é peregrinar

Espalhar sementes de si mesmo

No fértil campo deste finito universo

Diverso em si

Único por essência

Fluindo, expandindo, contraindo

Faíscas de pensamentos

Em pequenas sombras de nomes e formas

Que entre cometas, asteróides e sentimentos

Se transformam

Reconstroem a liberdade da vida sem morte

Com sorte e com norte

No caminhar essencial

Em todas as direções

Oráculo de todas as sensações

Aforismos de augustas sabedorias

Explosivo vulcão de todas as revelações

Lavas intensas de contagiantes alegrias

Lago sereno das humanas manifestações

Harmonia em essência, profunda calmaria

Paisagens holísticas de individuais visões

Além do todo, infinitas fantasias

Inteligência consciente

De um si mesmo evidente

Ontem, hoje e amanhã

No tempo e no espaço

Dimensionalmente sempre presente.

Para citar este Poema:

Cargnin dos Santos, Tadany. Sempre Presente.www.tadany.org®

Enxugos e picolés

Por: Mona Vilardo

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Semana passada não escrevi aqui. Estava muito envolvida com o espetáculo de formatura dos meus alunos do quinto ano. Eu sou da opinião que aprendemos muito com as crianças, no texto “Hoje não, Senhor Medo” falo um pouco sobre isso.

Como toda formatura, teve festa no dia seguinte e mais um episódio contribuiu para o meu aprendizado com esse público infantil.

Normalmente eu gosto muito de brincar com as crianças em festas assim. Se a festa é para elas, sou da opinião que não se tem outra coisa a fazer do que ficar e brincar com elas. Bem, promessa é dívida e eu prometi que iria brincar. E claro, fui cobrada por eles assim que coloquei o pé na festa. Como é gostoso o ser autêntico das crianças.

– Tia, entra na piscina com gente? (Foi o primeiro pedido deles, e tia aqui não sabia que tinha piscina)

– Mas a tia não trouxe nada para entrar na piscina…

Então, depois de vários cutucões nas costas com aquelas carinhas pedindo que eu entrasse na piscina, eu respondi:

 – Ok, arruma uma blusa pra mim que eu entro de legging e blusa, combinado?

Em menos de 1 minuto a blusa apareceu como num passe de mágica. Imagino que foi quase como um pique bandeira, um corre-corre para encontrar a tal blusa para a tia Mona entrar na piscina.

Brincadeiras e mergulhos animados, hora de sair para almoçar. Saindo da piscina, eu viro para uma aluna e falo:

– Olha, me empresta uma tolha, hein! Eu não trouxe nada.

Rapidamente, ela me dá a seguinte resposta:

– Tia, criança não se enxuga!

“Tia, criança não se enxuga” um prato cheio para uma boa escrita. Ao meu entender foi tipo: “Tia, já que você tá com a gente aqui, entra no mesmo clima, ok? ”

Pois é, quem dera que nós adultos também não nos enxugássemos. Pensando nisso, comecei a fazer uma lista na minha cabeça sobre coisas que não deveríamos enxugar:

Gentileza: Lembro da frase do filme “Extraordinários”: “Entre ser gentil e estar certo, escolha ser gentil”. Como seria bom se nos inundássemos de gentileza.

Empatia: Quem dera deixássemos escorrer empatia, sempre nos colocando no lugar do outro.

Alma infantil: Ser infantil nada tem a ver com ter a alma infantil. Enxergar o mundo por um lado mais prático e mais leve. Eu gosto mesmo é de me encharcar de uma alma infantil.

Logo depois da piscina, tomamos picolé. Eu escolhi o de milho verde. Nessa hora, na percepção dos meus alunos, toda a minha alma de criança foi por terra abaixo:

– Poxa, tia. Milho verde? Só minha avó e você que tomam picolé de milho verde! Tanto picolé bom, chocolate…chiclete… – Eles falaram indignados com o meu pedido.

– Pois é, queridos alunos, se tem uma coisa que aprendemos com o tempo é que nem só de picolés de chocolate e de chiclete a vida é feita. É importante aumentar o nosso leque de provas e escolhas.

– Vamos fazer o seguinte: Eu paro de me enxugar e vocês se arriscam em outros sabores. Seguimos uns aprendendo com os outros. Crianças e adultos. Por menos “enxugos” e mais picolés de milho verde!

Crônica – o que eu sei sobre o samba.

Por: Diogo Verri Garcia

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No último domingo, 02 de dezembro, comemorou-se o dia nacional do samba. Hoje, dia 05, o aniversário de meu pai. Alinhavando as duas datas, faço esta crônica em cumprimento à minha agenda semanal de textos, mas também em saudação ao natalício de meu genitor, neste ano, comemorado exatamente em uma quarta-feira, data dedicada às minhas publicações.

Faz alguns dias, divulguei em uma rede social um vídeo do show do cantor e compositor Paulinho da Viola, a que compareci, após algum longo tempo sem ir. O espetáculo ainda trazia as vozes da Velha Guarda da Portela e do Cantor Criollo, apresentado no Centro do Rio de Janeiro, na casa de espetáculos nominada Fundição Progresso

Tão logo foi ao ar a publicação, várias pessoas que me conhecem há menos tempo “se surpreenderam” por eu gostar de Paulinho e por ser visto em um samba – de roupa social, inclusive. “Você é muito formal para isso” – disseram alguns, quer pessoalmente, quer por mensagens. Talvez a gravata do dia-a-dia e o modo da fala deem essa impressão que, ressalto, não é por toda imprecisa.

Não foi a primeira vez que ouvi esse estilo de música – som cadenciado que inaugura a crônica, já em seu título –, tampouco era debutante em um show do referido artista. O meio musical, por um longo tempo, fez parte do cotidiano da minha vida. Hoje estou afastado, é fato. Mas também é fato que passei o final da minha infância até o início da minha juventude frequentando a quadra da Portela, em Madureira, assim como pontos desse gênero musical espalhados pelo Rio de Janeiro – bem como os de seu coirmão instrumental, o choro. Aqueles que me conhecem há mais tempo, sabem do que passo a falar; os mais recentes, talvez não.

Desde pequeno, sempre fui criado no mundo da música: aos cinco anos, era levado pelo meu pai aos programas de samba que ocorriam na Rádio Roquette Pinto, em que existia uma enorme mesa oval com variadas cadeiras e microfones, e uma luz vermelha que, quando acesa, eu não poderia falar – e, naquela ocasião, ainda não entendia o porquê de tal regra.

Do mesmo tempo vem a lembrança do primeiro momento em que decidi compor: ao ver meu pai cantarolando na área de serviço de nossa antiga casa, vestido com uma camisa preta, que estampava um barco e algumas ondas em tom de azul claro, na altura do peito. Naquele dia, pensei: – também consigo! – arrazoei, mas não consegui. De certo, aquele barco não virou música alguma – o que, no Direito, chamaria de ineficácia relativa do meio, no caso, eu, garoto de quatro ou cinco anos –, mas abriu caminho para minha primeira canção, alguns meses depois: a repetitiva “Você é a luz do meu olhar” – cantada na voz aguda e desafinada de uma criança –, escrita para a filha da vizinha da casa de trás.

“Você é a luz do meu olhar,

É a luz do meu viver

É a luz do meu sonhar

Você é uma estrela de cinema

Uma estrela de amor

Uma estrela de paixão

Você é a namorada que sonhei

E que tanto desejei

Bate forte no meu peito.

Será que você não entendeu

Que meu amor é só teu

Você tem todo direito”

(Repetir 35 vezes, ou mais)

Daquele tempo, trago a feliz lembrança de que sequer ou mal sabia escrever, e sempre pedia ao meu pai – quando se sentava em uma cadeira de balanço, há muito não mais existente –, para registrar as tentativas de versos que me vinham à mente. A motivação para o então nascimento de um novo compositor – hoje, abraçado menos à música e tão mais ao Direito – teve nome: Murilo Garcia de Souza, ou, nas assinaturas musicais e no cadastro do ECAD, Murilo Garcia.

Meu pai sempre foi – e ainda é – aficionado por música. Iniciou compositor da GRES Unidos de Lucas, ainda na década de 1970 e posteriormente migrou para o GRES Portela. Nos idos de 1985, teve sua própria produtora musical (ProArt Rio), paralela às atividades que exercia no Mercado de Capitais, época em que lançou o LP (disco de vinil, para quem não sabe) “Só Falta Você”, produzido por Adelzon Alves, amigo de papai, o mesmo que assinou obras de Clara Nunes, Alcione, João Nogueira, Dona Ivone Lara, dentre outros – e que presidia programas de samba da Rádio MEC e Nacional.

Nesse mesmo período – permito-me a observação –, de coexistência de vida musical e laborativa, conheceu minha mãe, em meio às reuniões que movimentavam as chefias do Banco, situado próximo ao Passeio Público: ele, responsável pelo setor de liquidações; ela, pelo departamento pessoal. Essa união deu azo a um moleque que nasceu e cresceu feliz e que, nesse crescimento, também caminhou pelas notas musicais – sim, estudei piano, teoria musical e cavaquinho –, antes de descambar, com satisfação, para o Direito.

Em toda minha infância e adolescência, minha casa sempre foi frequentada por musicistas e por compositores, muitos deles que, de alguma forma, registraram seu renome no ofício do samba. Na juventude, os amigos reclamavam quando eu condicionava minha ida às festas jovens (denominadas: balada, boate, matinê ou somente festa, a depender da região do país) à vindoura ida deles à Roda dos Embaixadores da Folia – que ocorria na Av. Gomes Freire, posteriormente transferida para a Rua do Lavradio, por volta de 2005, sob coordenação de Claudio Cruz. Já um pouco mais crescido, desistiram de vez de convidar para as baladas juvenis. E, adulto, foi minha vez de, por conta própria, reduzir minhas idas, até o momento em que praticamente cessei a frequência aos eventos de samba e de choro, muito por conta dos primeiros estudos para concursos públicos, em 2007, e pela intensa dedicação ao Direito, nos anos finais de faculdade.

Na data de hoje, revivendo  aquela época – uma das vantagens que nos traz a escrita –, permito-me lembrar um pouco das pessoas que frequentavam nossas vidas, brilhantes nas obras autorais que apresentavam ou na forma como conduziam seus instrumentos musicais. O palco, muitas vezes, era minha própria casa, quando organizávamos (nisso me incluo, embora tivesse onze ou doze anos) feijoadas repletas de música, samba, chorinho, cavaquinhos e violões.

Se posso citar alguns deles, os quais guardo com boas lembranças, pois fizeram parte de uma etapa feliz da minha vida, trago logo à mente a figura de um carismático senhor, que me foi apresentado como Picolino da Portela – cujo nome real era Claudemiro –, o qual tem seu nome cantado na música “De Paulo a Paulinho”, canção que anima frequentemente as apresentações e os shows de samba. Dele, ganhei um caminhão de madeira, por ele próprio construído, guardado por mim até hoje.

Dessa mesma época, também conviveram conosco Ary do Cavaco, autor que, após seu falecimento, deu nome à Ala de Compositores da agremiação Portela; Jurandir da Mangueira; Hélio, da Em Cima da Hora; Mauro Duarte Filho, e tantos outros. Entre os instrumentistas, ressalto Pedrinho Sete Cordas (nome que é dado em referência à sétima corda que é plasmada em alguns violões, tornando a execução mais complexa), exímio violonista e ex-integrante do grupo Chapéu de Palha; Sebastião, ou apenas “Bizu do Cavaco”; “Seu Josué”, bandolinista primoroso, pai de meu antigo professor de cavaquinho, Cláudio; e Ismael Silva, irreverente pandeirista, marido de Dona Ana e sobrinho do homônimo Ismael Silva, fundador da primeira escola de samba de nossa história, a “Deixa Falar”.

Dentre os cantores, recordo da qualidade vocal de Clarice Seabra e de Cesar do Vale, dos quais não tive mais notícias…

Foram dias felizes, assim como os atuais são. Hoje, troquei o palco pelas tribunas e os momentos de versos pelas noites de livros. Mas quem sabe um dia apareço por lá…

Ao meu pai, Murilo Garcia, fantástico amigo e compositor, uma felicitação pelos seus 69 anos, comemorados hoje. E um agradecimento por ter me apresentado a música, o amor de pai e a vida. Te amo.

Rio de Janeiro, 05 de dezembro de 2018

Diogo Verri Garcia

Ps: compartilho agora com vocês, por fotografias, um pouco dessa história:

Foto 1: provavelmente, de 2001, época de música e feijão em minha casa, em que aparecem Ary do Cavaco, Pedrinho 7 cordas, Clarice, Hélio, Cesar e Ismael Silva

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Foto 2: que inaugura a capa desta publicação, datada de 2003 (exatidão na data), em que se repetem as pessoas acima, adicionadas as imagens dos velhos amigos Hesly e Carine.

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Foto 3: sem data. Da esquerda para a direita, com papai, Piccolino, Ary e Jurandir.

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Foto 4: do ano 2000, quando subi pela primeira vez para cantar em um palco, acompanhado pelo Grupo Show da Portela, com Ary e Clarice. Esse dia contou com as apresentações de Piccolino e de Guilherme de Brito.

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Foto 5: de papai, na época em que teve um programa de rádio com Picolino.

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Vídeo 1: Por fim, deixo o registro de um vídeo, de 2014, quando reunimos alguns amigos e fomos comemorar o dia do aniversário de papai, também em um 5 de dezembro, na quadra da sua escola de samba, a Portela – última vez que apareci por lá.